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25 de Abril de 2024

Padre é condenado a pagar danos morais por impedir interrupção de gravidez

Recente decisão do STJ.

há 7 anos

Em decisão unânime, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) condenou um padre do interior de Goiás a pagar indenização de danos morais no valor de R$ 60 mil por haver impedido uma interrupção de gestação que tinha sido autorizada pela Justiça.

Em 2005, o padre Luiz Carlos Lodi da Cruz impetrou habeas corpus para impedir que uma mulher grávida levasse adiante, com auxílio médico, a interrupção da gravidez de feto diagnosticado com síndrome de Body Stalk – denominação dada a um conjunto de malformações que inviabilizam a vida fora do útero. No habeas corpus impetrado em favor do feto, o padre afirmou que os pais iriam praticar um homicídio.

Acompanhando o voto da relatora, ministra Nancy Andrighi, a Terceira Turma entendeu que o padre abusou do direito de ação e violou direitos da gestante e de seu marido, provocando-lhes sofrimento inútil.

Ao saber que o feto não sobreviveria ao parto, os pais, residentes na cidade de Morrinhos, a 128 quilômetros de Goiânia, haviam buscado – e conseguido – autorização judicial para interromper a gravidez.

Durante a internação hospitalar, a gestante, já tomando medicação para induzir o parto, foi surpreendida com a decisao do Tribunal de Justiça de Goiás, que atendeu ao pedido do padre e determinou a interrupção do procedimento.

A grávida, com dilatação já iniciada, voltou para casa. Nos oitos dias que se seguiram, assistida só pelo marido, ela agonizou até a hora do parto, quando retornou ao hospital. O feto morreu logo após o nascimento. O casal ajuizou uma ação por danos morais contra o padre, que preside a Associação Pró-Vida de Anápolis. Não obtendo sucesso na Justiça de Goiás, recorreu ao STJ.

Aterrorizante

Em seu voto, Nancy Andrighi classificou de “aterrorizante” a sequência de eventos sofridos pelo casal.

“Esse exaustivo trabalho de parto, com todas as dores que lhe são inerentes, dão o tom, em cores fortíssimas, do intenso dano moral suportado, tanto pela recorrente como pelo marido”, disse.

A ministra afirmou que o caso deve ser considerado à luz do entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 54, julgada em abril de 2012, quando se afastou a possiblidade de criminalização da interrupção de gestação de anencéfalos.

“É inegável que ambas as condições, anencefalia e síndrome de Body Stalk, redundam, segundo o conhecimento médico atual, na inviabilidade da vida extrauterina”, comparou a ministra.

Embora o julgamento da ADPF tenha sido posterior ao caso, a ministra assinalou que a orientação manifestada pelo STF não tem limites temporais, e já em 2005 era a mais consentânea com as normas constitucionais, inclusive pela reafirmação do caráter laico do Estado brasileiro e pelo reconhecimento da primazia da dignidade da gestante em relação aos direitos de feto sem viabilidade de vida extrauterina.

Ação temerária

A relatora avaliou que o padre agiu “temerariamente” quando pediu a suspensão do procedimento médico de interrupção da gravidez, que já estava em curso, e impôs aos pais, “notadamente à mãe”, sofrimento inócuo, “pois como se viu, os prognósticos de inviabilidade de vida extrauterina se confirmaram”.

De acordo com a ministra, o padre “buscou a tutela estatal para defender suas particulares ideias sobre a interrupção da gestação” e, com sua atitude, “agrediu os direitos inatos da mãe e do pai”, que contavam com a garantia legal de interromper a gestação.

Andrighi refutou ainda a ideia de que a responsabilidade não seria do padre, que apenas requereu o habeas corpus, mas, sim, do Estado, pois foi a Justiça que efetivamente proibiu a interrupção da gestação.

Segundo ela, “a busca do Poder Judiciário por uma tutela de urgência traz, para aquele que a maneja, o ônus da responsabilidade pelos danos que porventura a concessão do pleito venha a produzir, mormente quando ocorre hipótese de abuso de direito”.

A turma condenou o padre ao pagamento de R$ 60 mil como compensação por danos morais, valor a ser acrescido de correção monetária e juros de mora a partir do dia em que a recorrente deixou o hospital.

Fonte: STJ

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Faz sentido desrespeitar o casal, a mãe e seu sofrimento, a ciência, a constituição e a própria justiça que já tinha analisado e autorizado a interrupção da gravidez... tudo para defender dogmas religiosos? Se até a Bíblia, pelo que sei , afirma que o ser humano goza de livre arbítrio... É a treva. Que os religiosos usem suas próprias vidas, orações e ações, para expressar a fé que carregam. Que não façam de outros corpos e almas o estandarte de suas próprias convicções religiosas. Eu hein!CRENDOSPADRE. Espero que esse casal consiga apaziguar esse episódio sofrido em sua história. E que depois disso suas vidas possam voltar a florir. Bom saber que pelo menos juridicamente o assuntoa foi bem resolvido. Agradeço a publicação do artigo. Esse tipo de verdade dói, mas é importante ser publicada para lembrarmos aspectos do país em que vivemos. Quando é que a opinião pública vai compreender que mesmo um aborto autorizado judicialmente é sempre fruto de uma decisão difícil, à qual os casais têm pleno direito? Isso é o mínimo de consenso que já deveríamos ter neste país. Caminhemos! continuar lendo

O aborto "autorizado judicialmente" é uma destas aberrações que no Brasil se tornaram normais. Primeiro, a vida é bem indisponível e assim não pode ser objeto de decisão judicial que a suprima e quando surge volta e meia uma "autorização judicial" para abortar, tal autorização não encontra qualquer base no ordenamento jurídico brasileiro, dado que o bem em questão é - nos termos deste mesmo ordenamento - indisponível. continuar lendo

O Padre não foi condenado por ter impedido aborto "legal". Não havia nada de "legal" no aborto em questão, tanto que a ordem foi concedida pelo fato de ter sido ilegal, ou seja, contrário à lei, já que as hipóteses de escusas absolutórias da época (2005), antes do STF mediante a ADPF 54 praticar um verdadeiro golpe contra a Constituição, legislando, ressalvavam a ausência de pena apenas em casos de estupro ou de risco de vida à gestante. Ainda, a propósito, o Padre Lodi, como grande jurista que é, já havia destacado em trabalhos monográficos que não existe o denominado "aborto legal", o que seria o mesmo que, por analogia, chamar um furto cometido por descendente contra ascendente de "furto legal". O furto, tal qual o aborto, é crime. Portanto, é ilícito. O fato de não ser punido, não significa que deixe de ser crime e, portanto, ato ilícito.

Essa decisão é a maior aberração jurídica que já vi na vida. Verdadeiro gesto de perseguição religiosa. Ela obstaculiza uma simples impetração de um Habeas Corpus como ato de "má-fé", sobretudo porque manejado no interesse da defesa de uma vida inocente. Ela pune o impetrante pelo só fato de ser padre, ressaltando o caráter "laico" do Estado. Ela vincula a vida de um bebê a pretensos "direitos da gestante e de seu marido". Direito de matar? Ela retroage decisão da ADPF 54 de 2012 em desfavor do padre, aplicando-a a um caso de 2005. Ela faz analogia da síndrome de Body Stalk a anencefalia. Por final, a concessão da ordem não vem a ser culpa do padre, mas o reconhecimento pelo Poder Judiciário local de fundamentos jurídicos plausíveis para sua concessão. Decisão absurda e muito aplaudida por aqueles que posam de tolerantes, mas são visceralmente intolerantes com religiosos, os quais devem ser tratados como cidadãos de segunda classe, reduzindo suas concepções filosóficas ao âmbito privado. continuar lendo

Com certeza o religioso não deveria ter entrado na justiça, mas entendo que uma vez que a própria justiça concedeu o pedido pleiteado, não pode vir depois condenar por danos morais... tá de brincadeira!!! continuar lendo

Acho que o Tribunal de Justiça de Goiás foi quem errou e portanto deveria pagar a indenização, pois desautorizou um procedimento que já havia sido autorizado. Absurdo terem desautorizado sem tomar conhecimento da causa. O Padre precisa se tratar. continuar lendo